Créditos: Repórter Brasil
Rede de
exploração sexual de São Gabriel da Cachoeira (AM) passa a ser investigada em
âmbito federal. Vulnerabilidade de meninas indígenas preocupa
Daniel
Santini, da Repórter Brasil
O
caso de exploração de crianças e adolescentes indígenas em São Gabriel da
Cachoeira, no Amazonas, passou à esfera federal. Além da investigação aberta há
cerca de um mês a pedido do Ministério Público Federal, agora a Secretaria dos
Direitos Humanos da Presidência da República e os deputados federais da
Comissão Parlamentar de Inquérito sobre Tráfico de Pessoas passaram a
acompanhar o caso. Na semana passada, a ministra Maria do Rosário visitou o
centro de acolhida Kunhantãi Uka suri (Casa da Menina Feliz), onde vítimas de
abusos receberam apoio de freiras salesianas. Os deputados, por sua vez, não só
aprovaram requerimento para uma diligência na cidade, como também a realização
de uma audiência pública para debater o problema.
As
primeiras denúncias da exploração foram feitas em 2008, mas nem o Ministério
Público Estadual, nem Polícia Civil, conseguiram desmantelar a rede de
pedofilia local. As violências cometidas ganharam repercussão nacional neste
mês, após notícias de que a virgindade de uma menina havia sido vendida por R$
20.
Meninas ameaçadas temem represálias. |
As autoridades ouviram
depoimentos de 12 garotas e listaram nove suspeitos. Quem acompanha a questão
na região alerta, no entanto, que a rede é bem maior. “Tem muito mais do que os
12 casos. Há muitas meninas amedrontadas por essas pessoas, meninas que se
calam diante de ameaças”, diz o bispo Edson Taschetto Damian, que afirma que
freiras da congregação que recebeu as vítimas vêm sofrendo ameaças e
perseguição.
“Elas
estão em contato com essas meninas mais pobres e exploradas. Acabam ouvindo e
descobrindo os casos, que não são poucos. Os órgãos judiciários locais estão
pouco presentes. Embora tenha Tribunal de Justiça e Procuradoria do Estado [em
São Gabriel da Cachoeira], os responsáveis vivem em Manaus e permanecem poucos
dias na cidade”, completa. De acordo com o religioso, a participação do
procurador Júlio José Araújo Junior, do Ministério Público Federal, foi
fundamental para que a investigação passasse ao âmbito federal.
Objeto sexual
“Por que existe essa exploração? Porque para alguns brancos o índio é objeto,
não conta, não tem dignidade ou valor. Eles fazem o que bem entendem”, diz o
bispo Edson. O crescimento populacional acelerado no município é apontado como
um dos fatores que agravaram a vulnerabilidade das meninas indígenas. O número
de moradores do município encravado na floresta, na fronteira do Brasil com
Venezuela e Colômbia, quase dobrou em duas décadas. De 23.140 pessoas em 1991,
passou para 37.896 em 2010, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). Mais de 90% dos moradores são indígenas.
Em
2008, a eleição do prefeito Pedro Garcia (PT) e seu vice André Baniwa (PV),
primeiros índios a assumirem o poder municipal, acelerou a urbanização. Muitas
famílias trocaram aldeias pela cidade, esperançosas em relação a acesso a mais
políticas e serviços públicos. A desigualdade social, no entanto, não mudou.
Segundo os dados mais recentes do IBGE, enquanto a renda média mensal dos
indígenas é de R$ 601, a da população de cor branca é de R$ 2.387.
A relação entre
urbanização acelerada em municípios indígenas e exploração sexual infantil não
é exclusividade do município no norte do Amazonas. Em julho do ano passado, em
encontro do Grupo de Estudos sobre Infância Indígena e Trabalho Infantil da Comissão
Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (Conaeti), integrantes
manifestaram a preocupação em relação a este tema. Dernival dos Santos,
representante dos índios Kiriris, afirmou na ocasião que a saída de jovens das
aldeias para as cidades trazia riscos de exploração pela prostituição e
alcoolismo.
Diante
da exposição das crianças indígenas ao risco de exploração sexual, os
integrantes apontaram a necessidade de estratégias prioritárias para lidar com
o problema.
Esta
reportagem foi produzida pela Repórter Brasil e faz parte da série de especiais
Meia Infância, parte integrante da campanha É da nossa conta! Trabalho infantil
e Adolescente
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