Estudo, que faz parte de uma
iniciativa global, constata que 3,7 milhões de crianças e adolescentes estão
fora da escola no Brasil.
Brasília, 31 de agosto – O Fundo das
Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e a Campanha Nacional pelo Direito à
Educação lançam hoje o relatório Todas as crianças na escola em 2015 –
Iniciativa global pelas crianças fora da escola. O estudo faz uma análise do
perfil das crianças e dos adolescentes fora da escola ou em risco de evasão no
Brasil e aponta as principais barreiras que levam a essa situação. Também
apresenta uma análise das principais políticas públicas de enfrentamento à
evasão e ao abandono escolar e faz uma série de recomendações.
A análise do relatório é baseada em
estatísticas nacionais. Segundo a Pnad/2009, cerca de 3,7 milhões de crianças e
adolescentes entre 4 e 17 anos de idade estão fora da escola no Brasil. Desse
total, 1,4 milhão têm 4 e 5 anos; 375 mil, de 6 a 10 anos; 355 mil, de 11 a 14
anos; e mais de 1,5 milhão de adolescentes têm entre 15 e 17 anos. O Censo 2010
confirma essa situação.
Um dos principais fatores de risco
para a permanência das crianças na escola é o fracasso escolar, representado
pela repetência e abandono que provocam elevadas taxas de distorção
idade-série. Mais de 3,7 milhões de alunos das séries iniciais do ensino
fundamental encontram-se com idade superior à recomendada para a série que
frequentam. Em termos absolutos, as regiões com maior número de alunos em risco
de abandono são a Nordeste (1,7 milhão de crianças) e a Sudeste (pouco mais de
1 milhão). Em termos proporcionais, as regiões com mais estudantes em risco são
a Norte (18,33%) e a Nordeste (17,68%).
Os efeitos da desigualdade na
educação
As maiores desigualdades verificam-se quando se levam em
consideração a raça ou a etnia e a renda familiar das crianças em risco de
abandono. Enquanto 30,67% das crianças brancas (1,6 milhão) têm idade superior
à recomendada nos anos finais do ensino fundamental, entre as crianças negras,
a taxa é de 50,43% (3,5 milhões).
O percentual de crianças de famílias
com renda familiar per capita de até ¼ do salário mínimo com idade superior à
recomendada chega a 62,02%. Já nas famílias com renda familiar per capita
superior a dois salários mínimos, a taxa é de 11,52%.
Dos adolescentes com idade entre 15 e
17 anos, mais de 1,5 milhão estão fora da escola (14,8% dessa população). O
maior contingente em termos absolutos está no Nordeste, com 524 mil
adolescentes; em seguida, vem a Região Sudeste, com 471 mil. Em termos
proporcionais, a região com mais adolescentes de 15 a 17 anos fora da escola é
a Sul (17,1%), seguida da Centro-Oeste (16,7%).
Em relação à educação indígena, os
índices educacionais têm melhorado nos últimos anos, mas há ainda barreiras a
ser superadas. Uma delas é a ampliação da oferta de ensino médio. As matrículas
nessa etapa de ensino não chegam a 6% do total da educação indígena no País.
Educação na Zona Rural
Um dos
maiores desafios para a universalização de toda a educação básica é a grande
dificuldade de acesso de professores e alunos às escolas de áreas rurais,
principalmente nas regiões Norte e Nordeste. De acordo com dados do Censo
Escolar 2009, cerca de 65% dos alunos matriculados em escolas rurais no Brasil
não são atendidos por sistemas de transporte escolar público.
Além disso, muitos currículos estão
desvinculados da realidade, das necessidades, dos valores e dos interesses dos
estudantes residentes no campo.
As taxas de distorção idade-série nas
zonas rurais das regiões Norte e Nordeste chegam a ser duas vezes maiores que
as das regiões Sul e Sudeste.
Em razão desses problemas, a
escolaridade da população rural é muito menor que a da população urbana. De
acordo com dados da Pnad 2009, as pessoas que vivem nas cidades têm, em média,
3,9 anos de estudo a mais que aquelas que vivem nas zonas rurais.
Barreiras para o direito de aprender
A pesquisa
demonstrou que o trabalho infantil e o atendimento inadequado ou inexistente às
crianças e aos adolescentes com deficiência são algumas das barreiras que
impedem que todas as crianças e todos os adolescentes estejam na escola e
tenham assegurado o seu direito de permanecer estudando, de progredir nos
estudos e de concluir a educação básica na idade certa.
O relatório também identificou o
atraso escolar como um dos principais fatores de risco para a permanência na
escola das crianças em situação de distorção idade-série decorrente de
repetência e abandono. Os alunos com idade superior à recomendada para a série
(dois anos ou mais de atraso) que frequentam os anos finais do ensino
fundamental somam mais de 5 milhões, de acordo com Pnad 2009, representando
41,87% do total de alunos e alunas nesse segmento do ensino fundamental.
Políticas e programas existentes
No Brasil,
políticas e programas vêm sendo desenvolvidos por diferentes esferas do poder
público para superar as barreiras que ainda impedem o pleno atendimento das
necessidades educacionais das crianças e dos adolescentes. Alguns programas são
voltados para a qualidade do ensino e o financiamento, como os de formação de
professores e o Fundeb. Outros, como o Bolsa Família e o Programa de
Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), condicionam o recebimento do benefício
à frequência à escola.
Recomendações do Relatório
Uma das
principais constatações do relatório é a importância da intersetorialidade das
políticas públicas para assegurar a universalização e a indivisibilidade dos
direitos da criança. Por exemplo, somente políticas intersetoriais poderão
garantir a inclusão e a permanência na escola e a aprendizagem de crianças e
adolescentes com deficiência, dos meninos e meninas egressos ou em risco de
trabalho infantil, ou das crianças e adolescentes abrigadas e em medidas
socioeducativas.
É preciso ainda eliminar da cultura
escolar a naturalização da repetência, da evasão, da não alfabetização na idade
certa e da não aprendizagem. Para isso, um bom caminho consiste em programar
processos de atenção individualizada e de avaliação contínua.
A valorização do profissional de
educação – que envolve remuneração adequada, plano de carreira e capacitação
constante – é condição indispensável para a garantia da qualidade da educação.
Iniciativa Global pelas Crianças Fora
da Escola
O relatório integra a Iniciativa Global Out of School Children
(Pelas Crianças Fora da Escola), do UNICEF e Instituto de Estatística da UNESCO
(UIS). A iniciativa analisa a exclusão e os riscos de abandono escolar em 25
países. Na América Latina e Caribe, participam Brasil, Colômbia e Bolívia. No
Brasil, vem sendo desenvolvida em parceria com a Campanha Nacional pelo Direito
à Educação, rede da sociedade civil que atua pela efetivação do direito
constitucional à educação no País.
Hoje também está sendo lançado um
relatório regional com a análise da situação nos países da América Latina e do
Caribe.