PRIORIDADE ESQUECIDA:Cooperação e Desenvolvimento pela Infância e Juventude

23 de jan. de 2013

PRIORIDADE ESQUECIDA




Assessora política do Inesc parceiro KNH Brasil aborda, em artigo publicado pelo Correio Braziliense, a questão da redução da idade penal que tornou a ter destaque por causa da crise na segurança pública, acentuada no final do ano passado.

Cleomar Manhas, doutora em educação e assessora política do Inesc 
(artigo publicado pelo Correio Braziliense e Estado de Minas)
Em 2013 queremos que os adolescentes estejam visibilizados e contemplados nas políticas públicas e não criminalizados como estão hoje, com tantas propostas de retirada de direitos, direcionadas a esta parcela da sociedade, que, de acordo com a Constituição Federal, tem prioridade absoluta com relação à ação do Estado. Vejamos o que diz o artigo  227: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
Ao chegarmos a mais um final de ano é comum renovarmos nossas esperanças e planos para o ano vindouro. Isso em âmbito pessoal, no entanto, quando atuamos para que as políticas públicas se desenvolvam tendo como parâmetro a realização de direitos humanos, renovamos esperanças coletivas relacionadas às políticas sociais.
Em momentos difíceis há sempre “bodes expiatórios” escolhidos para justificarem as tensões. A crise do momento, capitaneada por São Paulo, diz respeito à segurança pública. Aliás, não se pode dizer que é a do momento, visto que desde o advento do crescimento exponencial das grandes cidades, ainda na década de 1980, o tema está em questão. E agora com uma novidade para os brasileiros, ela não se restringe aos tradicionais centros tais como São Paulo e Rio de Janeiro. A violência acompanhou a tendência de descentralização dos pólos de desenvolvimento econômico e está em lugares ainda não acostumados a sua presença. E os “bodes expiatórios” são os adolescentes, para os quais há vários projetos em tramitação no Congresso Nacional solicitando a redução da idade penal.
O mapa da violência de crianças e adolescentes 2012, pesquisa realizada pela Flacso, sob a responsabilidade do professor Júlio Jacobo Waiselfisz,   apresentou dados alarmantes acerca da violência sofrida por crianças e adolescentes na faixa etária compreendida entre 0 e 19 anos. O Brasil ocupa o 4º lugar em um conjunto de 99 países, com maiores índices de homicídios nesta faixa etária, com crescimento de 346% entre 1980 e 2010. Sendo os adolescentes entre 14 e 18 anos as maiores vítimas.
A partir desta pesquisa podemos inferir que os adolescentes são parcela da população fortemente vitimada pela violência, especialmente, homicídios, com estatísticas preocupantes e em  total confronto com os princípios de direitos humanos. No entanto, o que vemos, tanto na mídia, quanto no Parlamento e em parte da sociedade é a criminalização desta parcela da população, ao invés de estarem refletindo sobre esses números que demonstram uma verdadeira epidemia.
Outro aspecto relevante diz respeito à educação. Apesar de o acesso à educação fundamental estar praticamente universalizado, no percurso entre esta etapa e o ensino médio a educação pública vai perdendo público. Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2011, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelam que a quantidade de adolescentes de 15 a 17 anos longe dos bancos escolares aumentou. Em 2009, 1.479.000  brasileiros nessa faixa etária não estudavam. Eles representavam 14,8% dessa população. Em 2011, o número de excluídos subiu para 1.722.000 (16,3% dos 10,5 milhões de jovens).
De acordo com estudo realizado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA),   acerca do Plano Nacional de Educação,  que está em votação no Congresso Nacional e guiará a política nos próximos dez anos, a faixa etária entre 15 a 17 anos será o maior desafio para a universalização da educação, visto o grande número de excluídos do sistema. E o desafio, ainda de acordo com o estudo, não diz respeito apenas à ampliação de vagas, mas também na garantia de permanência e progressão dos estudantes ao longo do ensino fundamental, de modo que ingressem, a partir dos 15 anos, no ensino médio e concluam a educação básica.
Os motivos de termos  expressivo número  de adolescentes fora da escola são vários e vão desde a falta de qualidade da educação, passando por  vulnerabilidades tais como o trabalho infantil, gravidez na adolescência, falta de transporte escolar, falta de acessibilidade para adolescentes com deficiência entre outros, que em comum têm o fato de serem  passíveis de resolução por meio de políticas públicas assertivas e integradas.
Muito se fala da necessidade de integração de políticas, mas pouco se faz, pois cada órgão público com seus gestores está sempre em busca da autoria e do protagonismo e não conseguem operar, de fato, em parceria. Porém, para os adolescentes é urgente que se ofereça um conjunto de políticas articuladas que incluam educação, saúde, cultura, Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, segurança pública, dentre outras que atuem de maneira sistematizada.
Há um enorme aparato legal de garantia de direitos dos adolescentes, tais como,  convenções internacionais, Constituição Federal, Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e por aí vai. Portanto, o que precisamos é que de fato elas se materializem em políticas que realizem plenamente os direitos humanos.

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