O
Fórum Nacional de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente – Fórum
Nacional DCA, parceiro KNHBrasil, tem 25 anos de existência. Representa 52 entidades da sociedade
civil organizada e 26 Fóruns Estaduais e do Distrito Federal de Defesa dos
Direitos da Criança e do Adolescente, sendo mais de mil e duzentas entidades,
entre organizações de atendimento, de defesa, conselhos de classe, sindicatos,
é hoje a maior coalizão brasileira em tema de Direito da Criança e do
Adolescente.
O
Fórum Nacional DCA vem a público repudiar mais uma tentativa de reduzir a
maioridade penal expressa nas forças conservadoras e reacionárias da sociedade
brasileira instaladas em vários segmentos.
Ao
instituir-se como espaço de luta, o Fórum Nacional DCA adotou como missão a
garantia da efetivação dos direitos das crianças e adolescentes, por meio da
proposição, articulação e monitoramento das políticas públicas e da mobilização
social, para construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Missão essa
que vem se mantendo ao longo desse tempo, mas que se renova em estratégias que
adota para dar a ela mais materialidade e efetividade.
Portanto,
é com essa legitimidade que o Fórum Nacional DCA contesta o
ressurgimento na mídia e em ambas as Casas do Congresso Nacional dos mais
diversos projetos de lei e de emendas à Constituição Federal com objetivo de
redução da idade para a responsabilização penal de adolescentes para diversas idades,
para ampliar o tempo de execução de medidas socioeducativas, especialmente a de
internação em estabelecimento
educacional, assim como para submeter o adolescente a quem é atribuída a
autoria de ato infracional a avaliação psicológica para que o juiz conclua se
ele pode ou não ser responsabilizado como adulto.
Nesse
contexto, com avaliação de que o parlamento recebe pressão por parte dos
setores mais conservadores, bem como com a intenção de oferecer resposta aos
anseios de parte da população que enxerga na prisão de adolescentes e jovens a
solução para as questões da violência, na Plenária do Conselho Nacional dos
Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA – realizada em 10 de julho de 2013, a Secretaria de
Direitos Humanos da Presidência da República, ao que parece, com o apoio do
Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF – apresentou proposta
denominada “Responsabilidade Progressiva”, prevendo sistema de
responsabilização do adolescente a quem é atribuída a autoria de ato infracional considerando a gravidade do ato
praticado e a idade do adolescente. Em razão de pedido de vista, a decisão do
CONANDA sobre o tema será tomada em Assembleia Extraordinária
designada para 30 de julho de 2013.
O
Fórum Nacional DCA não aceita qualquer iniciativa de deslegitimar os
direitos da criança e do adolescente no Brasil, principalmente quando se trata
da redução da idade para responsabilização penal e nem o argumento do medo.
Melhor seria que o Estado Brasileiro observasse os seguintes pontos:
1. Na Constituição Federal prevê-se que não “não será
objeto de deliberação a proposta de emenda [...] tendente a abolir os direitos
e garantias individuais” (art. 60, § 4º, inciso IV). Trata-se da chamada
“cláusula pétrea”;
2. O princípio constitucional de proibição do
retrocesso no domínio dos direitos fundamentais e sociais visa a impedir que
sejam frustrados os direitos civis, políticos, sociais, culturais e econômicos já concretizados, tanto na ordem
constitucional como na infraconstitucional, em atenção aos objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil, que são os de: promover o bem
de todos, sem quaisquer formas de discriminação; constituir uma sociedade
livre, justa, solidária; erradicar a pobreza e a marginalização; reduzir as
desigualdades sociais e regionais (CF, art. 3º), o que se dá mediante a
implementação e efetivação do Estado Democrático de Direito.
3.
O Brasil foi recomendado em 2004 pelo Comitê dos Direitos da Criança das Nações
Unidas, previsto Convenção sobre os Direitos da Criança, a dar especial atenção
à plena implementação do artigo 4º da Convenção, tendo em consideração os recentes
desenvolvimentos econômicos positivos, priorizando e aumentando a alocação
orçamentária para assegurar, em todos os níveis, a implementação dos direitos
das crianças, particularmente aquelas pertencentes a grupos marginalizados e
economicamente em desvantagem, incluindo crianças afrodescendentes e crianças
indígenas, “ao máximo dos recursos disponíveis e, quando necessário, dentro de
um quadro de cooperação internacional”.
4. Implementar a
execução das medidas socioeducativas regulamentada pela Lei 12.594, de 18 de janeiro
de 2012, que corrobora as Resoluções 119 e 112, do CONANDA, que explicita a
necessidade de formação continuada para todo o Sistema de Garantia dos Direitos
da Criança e do Adolescente. Ambas as Resoluções mencionadas e a própria Lei
12.594, de 2012, permanecem completamente ignoradas.
Diante do exposto, Fórum Nacional DCA não compactua com
qualquer tentativa de retrocesso na garantia dos direitos da criança e do
adolescente. Diversamente, entende que devem ser implantadas estruturas institucionais
sólidas, em cumprimento ao disposto na própria Constituição Federal.
É necessário relembrar que alguns posicionamentos do Fórum
Nacional DCA foram apresentados formalmente aos governantes, já em dezembro de
2010, com a Carta Aberta à Presidenta Dilma Rousseff. Nela existem propostas
positivas, cujos temas estão sendo paulatinamente discutidos e aperfeiçoados em
diversos momentos pela Rede do FNDCA.
Relembram-se e atualizam-se os pontos principais da proposta
do Fórum Nacional DCA de 2010, que sugere pelo menos uma proposta de emenda à
Constituição Federal e projeto de lei para fortalecimento do Sistema de
Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente: constitucionalização dos
Conselhos Tutelares, garantindo-se organização, remuneração, e eleição pela Justiça
Eleitoral; constitucionalização dos Conselhos dos Direitos da Criança e do
Adolescente; entre outros temas. A par disso, é necessário garantir formação
para os direitos humanos, a solidariedade, o amor, a paz, e para a participação
política, tanto na educação formal, a partir das creches, como nos meios de comunicação
de massa; também há previsão de dispositivos relacionados ao orçamento criança
e adolescente, inclusive com proibição de contingenciamento e previsão
constitucional de que, caso não sejam executados completamente, os recursos
serão automaticamente convertidos em financeiro e depositados na conta do fundo
dos direitos da criança ao final do exercício. Também previsão de percentual
mínimo para o fundo dos direitos da criança. Nada do que está na Carta Aberta,
porém, pode ser obstáculo ao diálogo.
Dessa forma, o Fórum Nacional DCA sugere ao CONANDA que dê
atenção à conclusão do Plano Nacional de Atendimento Socioeducativo. E não permita
retrocessos na garantia dos direitos da criança e do adolescente, pois o
contrário não seria apenas violação dos direitos já assegurados, mas verdadeira
estupidez com consequências irreparáveis, que demonstraria a incapacidade do
Estado Brasileiro de cumprir a lei, preferindo abraçar alternativas danosas
apenas para dar resposta a setores conservadores.
O Fórum Nacional DCA convoca toda sua Rede e entidades
parceiras que emitam notas, divulguem e ampliem para as diversas mídias, seu repúdio
aos retrocessos no Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do
Adolescente.
Brasília, 22 de julho de 2013.
Secretariado do Fórum Nacional de Defesa dos Direitos da Criança e do
Adolescente.